sexta-feira, 9 de abril de 2010

NESTE FIM DE SEMANA, NADA A FESTEJAR

Solidariedade às vítimas da tragédia do Estado do Rio

Nesta sexta-feira, o editor deste Blog deixa de publicar as tradicionais dicas do fim de semana e presta solidariedade às vítimas das fortes chuvas que inundam o Estado do Rio, em particular a sua região metropolitana, desde a noite de segunda-feira. Nesta oportunidade, publicamos o relato do jornalista e amigo Fernando Paulino, morador de Niterói, sobre a situação caótica em que se encontra a sua cidade, onde é registrado o maior número de perdas humanas. Ao final da postagem anterior (quinta-feira) estão disponíveis os endereços de ajuda aos desabrigados da cidade do Rio.

Niterói chora

Nesses últimos dias, a impressão que se tem é de que quem mora em Niterói, como eu, caminha por uma cidade-fantasma: lama por tudo o que é lado, falta de luz – consequentemente, comida estragando, computador desligado etc – e dividindo espaço nas ruas com ratos e lacraias.

A tragédia se ampliou na madrugada desta quarta para quinta-feira, quando veio abaixo um morro artificial no bairro Viçoso Jardim. Falam em mais de 200 pessoas soterradas.

Lembro que há uns 30 anos fui fazer uma reportagem no lixão que existia lá. Na época, eram umas 100 pessoas de todas as idades que viviam do lixo, revendendo sobras de produtos vários, reaproveitando gêneros alimentícios, construindo ali mesmo seus barracos, com materiais de construção jogados ali. Já se sentia o cheiro forte de gases que saía do lixo; havia uma fumaça constante.

Com o passar do tempo, o lixão começou a ser desativado e novas moradias foram construídas no local. Não era um morro natural. Era um morro artificial, erguido em cima da omissão de sucessivos governos. Desta maneira, o Morro do Bumba (foto) ganhava uma parte alta, onde havia o lixão.

O morro que veio abaixo reunia uma grande concentração de negros, muitos deles integrantes da Escola de Samba Acadêmicos do Cubango, cuja quadra fica ali perto. A Cubango, que fez 50 anos de fundação em dezembro passado, é uma agremiação que até hoje concentra descendentes dos primeiros negros que por aqui chegaram. Daí o nome Cubango – em homenagem a um rio africano -, daí os frequentes enredos sobre a questão afro – “Afoxé”, “Fruto do Amor Proibido”, “Mercedes Batista” etc.

Algumas dessas casas destruídas serviam de ateliês de costureiras, aderecistas, artesãos da escola. Eram também moradas de passistas, ritmistas, sambistas em geral. População negra, trabalhadora e carente.

A primeira vez que desfilei na Cubango tem quase uns 20 anos; sempre que posso, estou por lá. Hoje, a comunidade está de luto. A cidade conta os seus mortos.

Fernando Paulino

Foto: Deslizamento no Morro do Bumba: casas foram soterradas e centenas de pessoas estão desaparecidas

Um comentário:

Luiz disse...

Ao assistir, chocado e entristecido, a mais uma tragédia anunciada no meu Rio de Janeiro, constato que o que tem ocorrido ao longo dos anos dessa nossa demagógica, corrompida e injusta "democracia ditatorial" é que, em vários casos, o homem, o ser humano, isto é, o administrador nunca é responsabilizado pessoalmente pelos males ocorridos em sua gestão. Sempre quem paga é a instituição a que pertence ou o Estado. Exemplo: a ditadura perseguiu, prendeu, torturou e matou. Aí vem o jogo de empurra: os subalternos dizendo que receberam ordens, os superiores se esquivando de responsabilidade. O reclamante, indubitavelmente tinha consciência dos riscos que corria, se sentindo prejudicado, processa o Estado e é indenizado com fortunas. Mas quem é esse Estado e de onde vem o dinheiro para tal? Vem dos impostos que o cidadão trabalhador paga. Então quem está pagando pelo erro alheio é o povo! No caso da atual tragédia no Rio de Janeiro, faz-se urgente que o Ministério Público Federal entre na história para responsabilizar, processar e condenar o governante, posto que se torna conivente e cúmplice desse tipo de tragédia por não ter política séria de habitação decente, por não coibir moradias em locais impróprios e não tomar quaisquer providências antes das tais tragédias anunciadas acontecerem, já que é notório o perigo para os moradores que vivem em áreas de risco. No mínimo ele deveria ser processado por falsidade ideológica por não cumprir as promessas de campanha. Aí, sim, ele pensaria duas vezes antes de se candidatar, de preencher seu discurso com falsas promessas e, se eleito, assumir destemida e impunemente o cargo pretendido. Também pensaria bem ao se mancomunar com empresários predadores e gananciosos, principalmente do turismo, da hotelaria, dos esportes, das empreiteiras e construções imobiliárias e de espetáculos “artísticos” que fazem o que bem querem, onde e quando querem, depredando e descaracterizando cada vez mais esta nossa ainda bela Cidade. Se não for assim, os problemas vão ser empurrados para os próximos eleitos e o barco-cidade vai continuar vazando água até afundar de vez.
Lula Dias, produtor cultural