Do compositor, maestro e escritor, Marcus Vinicius, presidente da Amar – uma das seis principais sociedades arrecadadoras representativas de músicos, arranjadores, regentes e produtores de cultura-, recebi a carta que reproduzo abaixo em que contesta o anteprojeto de revisão do direito autoral do ex-ministro Juca Ferreira.
Vinicius preside uma sociedade com 14 mil filiados, cuja diretoria é integrada , entre outros, pelo compositor e escritor Paulo César Pinheiro (vice-presidente), o maestro violonista e arranjador, Maurício Carrilho, e o compositor e escritor Nei Lopes.
Em nome do segmento, ele defende a nomeação da ministra Ana de Holanda, pela expectativa que gera quanto ao fim da abordagem ideológica da questão, que predominou no governo Lula, a ponto de se propor a socialização do direito do autor.
Segundo Vinicius, o movimento contra o anteprojeto de Ferreira já é do conhecimento informal da ministra, mas deverá ser formalizada em encontro ainda a ser agendado com a nova titular da Cultura.
A Carta
“Os filiados às sociedades arrecadadoras de direitos autorais representativas de artistas e produtores de cultura, apóiam a nova Ministra da Cultura, Ana de Holanda, na sua decisão de reexaminar, de forma justa e ponderada, a questão dos direitos autorais no país.
Falo oficialmente em nome da Amar – Associação de Músicos Arranjadores e Regentes – por mim presidida, com 14 mil titulares de direitos autorais.
Mas sei que esse é o pensamento também das outras cinco principais sociedades arrecadadoras – Socinpro, Abramus, UBC, Sicam e Sbacen- que, somadas à Amar, representam os interesses de 86 mil autores.
Recebemos com expectativa positiva a decisão da presidenta Dilma Rousseff de nomear para a Pasta uma pessoa capaz de dar transparência a essa questão, até agora tratada de forma inaceitável pelo seu antecessor que chegou a encaminhar para a Casa Civil um anteprojeto de nova lei autoral, sem dar qualquer conhecimento deste à sociedade brasileira.
É acertado o propósito da nova Ministra em convocar juristas e especialistas para reexaminar as alterações à atual lei, se necessárias.
O Direito Autoral é matéria jurídica e não pode ser tratada como tema de varejo cultural, ou em discussões de botequim.
É inconcebível e suspeita a reação dos que querem afrontar uma Ministra, antes mesmo que assumisse o cargo, pelo simples fato de propor a rediscussão equilibrada de temas polêmicos.
Desconfiamos de todos os que, supostamente em nome da cultura, investem contra a propriedade intelectual e suas instituições.
Sabemos que por trás deles estão quase sempre os interessados em não pagar a remuneração devida aos criadores, as grandes corporações das comunicações que buscam dominar o mercado cultural e até mesmo artistas pouco esclarecidos que atribuem erradamente ao Direito Autoral o fato de estarem excluídos mercado.
Em plena sociedade da informação, é inconcebível investir contra os direitos dos que criam e produzem cultura, o principal motor daquela.
Caso não defenda adequadamente a propriedade intelectual, o Brasil correrá o risco de fragilizar seu patrimônio cultural perante o mundo.
Investir na defesa desse patrimônio é uma aposta estratégica do país como produtor de cultura, caso desejemos que nossos bens e serviços culturais gerem riquezas à nação e aos seus cidadãos, em vez de ficarem restritos ao circuito da miséria, da economia informal e desmonetizada.
Como a saúde, a educação e a segurança, a cultura também é um dever de Estado e deve ser acessível a todos, mas isso não pode ser obtido à custa da limitação dos direitos dos cidadãos que criam e produzem cultura.
Cabe ao Estado buscar formas para que a distribuição de bens culturais seja mais ampla e o acesso à cultura seja democratizado, mas isso não significa restringir direitos de quem cria e produz.
A agenda desenvolvimentista da Presidente Dilma certamente será inspirada no lema ‘crescimento com democracia’, o que pressupõe respeito aos direitos da cidadania, entre os quais o direito à propriedade intelectual.
É por saber que a Ministra da Cultura, Ana de Hollanda, compartilha desses princípios, que a apoiamos veementemente”.
MARCUS VINÍCIUS DE ANDRADE
Presidente da Amar - Associação de Músicos e Arranjadores
Comentário
Caro Marcus Vinícius,
Discordando de você e do conteúdo desta manifestação pública, externo abaixo minha opinião pessoal.
Fundamentando minha discordância diria que as obras artísticas, interesses e a defesa dos direitos de autor não podem continuar contemplando prioritariamente apenas os interesses de apenas algumas categorias de autores/criadores, como determinado pela atual legislação brasileira de Direito Autoral.
Por outro lado, caro amigo, diria também que bastaria um google para constatar que, ao contrário do afirmado neste artigo, a proposta de reforma e de modernização da atual legislação sobre o direito autoral resultante do processo instaurado pelo MinC, além de não objetivar ou prever qualquer fragilização dos instrumentos legais necessários ao exercício dos legítimos e inalienáveis direitos de autor constitucionalmente previstos, também não contempla qualquer possibilidade de “estatização” do processo de arrecadação destes direitos, mas apenas da criação de mecanismos que garantam a necessária transparência e controle social sobre as entidades “privadas” que por força da lei e de acordo entre as partes exercem atualmente essa função de forma reconhecidamente monopolista.
Necessário se faz também registrar que a proposta busca implementar marcos legais e mecanismos de arrecadação sobre a veiculação promovida através das plataformas digitais. O que também não é previsto, nem contemplado pela legislação atual.
Creio ainda ser necessário e justo o registro de que a proposta elaborada pelo MinC, após amplo e democrático processo de debates e consulta social, reforça, amplia e fortalece, o exercício do controle e da arrecadação de direitos autorais de autores/criadores relacionados a linguagens artísticas/culturais, cujos direitos (infelizmente) não são contemplados, nem defendidos pela legislação em vigor.
A proposta do MinC busca ainda, equilibrar o já referido e legítimo direito de autor, com o também legítimo e indispensável exercício dos direitos de acesso à informação, à cultura e ao conhecimento previstos na Constituição Brasileira e em várias Cartas e compromissos firmados internacionalmente pelo Brasil, dentre os quais, merecem especial registro: a Carta dos Direitos Humanos e a Convenção Universal em Defesa da Diversidade Cultural.
Julgo necessário ainda, reafirmar que a proposta, ao contrário do afirmado na matéria, foi sim ampla e democraticamente debatida por toda a sociedade brasileira (inclusive por representantes da AMAR e de todas as outras sociedades representativas dos autores musicais brasileiros filiadas a entidade de arrecadação coletiva do setor – ECAD), como resta comprovado através de ampla documentação e noticiário veiculado através de centenas de jornais, rádios, tvs e veículos de mídia alternativa e digitais brasileiros.
Assim, registro finalmente que se é verdade que não existem obras artísticas sem que existam e sejam respeitados os direitos de autores/criadores, também é verdade que os objetivos de tais obras só fazem sentido e se perpetuam através de sua comunicação ao público.
Pelos direitos de autor e do público.
Fraternalmente,
João Baptista Pimentel Neto
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