segunda-feira, 2 de novembro de 2009

PALANQUE TUCANO

Tucanos usam atividade da USP como palanque

Por Dennis de Oliveira* 30/10/2009

No dia 29 de outubro, a Pró-Reitoria de Pesquisa da USP convocou todos os professores orientadores e alunos bolsistas para uma apresentação dos trabalhos do Programa de Pré-Iniciação Científica, a ser realizado no Centro de Convenções Rebouças. O Programa de Pré-Iniciação Científica foi uma iniciativa da USP e tinha como objetivo desenvolver atividades de científicas com alunos da rede estadual de ensino médio, previamente selecionados, sob a orientação de professores da universidade que, para isto, deveriam apresentar projetos de pesquisa.

Por achar interessante esta parceria da universidade com o ensino público, apresentei um projeto de monitoramento de periódicos alternativos no Brasil, dentro da idéia que desenvolvo na universidade de construir um método de recepção crítica e cidadão dos meios de comunicação. Fui contemplado com três bolsistas, todos alunos de uma escola pública de Cotia. Fiquei sabendo depois do valor ridículo da bolsa, R$ 70,00 e também que os bolsistas não teriam direito a uma cota de passe escolar, o que fazia com que praticamente toda a bolsa (ou mais) fosse consumido pelos gastos com transporte.

Também fiquei sabendo que o programa era bancado por duas multinacionais, o Banco Santander e a Monsanto, a fabricante de transgênicos, empresa que a atual pró-reitora Mayana Zatz tem fortes ligações. E, finalmente, também soube depois que os alunos deveriam contar com um professor supervisor na escola de origem e que estes professores não receberam um centavo da Secretaria da Educação para tal tarefa, nem treinamento que estabelecesse qual é o seu papel.

Apesar de tudo isto, toquei a proposta. Os alunos eram fantásticos, desenvolveram as atividades da pesquisa de forma competente, mesmo com as dificuldades de deslocamento (demoravam até duas horas da escola em Cotia para a USP), o professor supervisor também era uma pessoa interessante, apesar de estar confuso pela total ausência de definição do seu papel. No final, chegamos a resultados importantes que mapeiam o processo de construção das informações de quatro periódicos alternativos no Brasil – o jornal Brasil de Fato e as revistas Fórum, Caros Amigos e Le Monde Diplomatique, isto após fazermos uma série de discussões sobre os filtros que atuam na produção da notícia, demonstrando que a mídia jornalística hegemônica atua como “um aparelho de propaganda” como define o pensador Noam Chomsky.

O que aconteceu no dia 29 de outubro? Um grande ato do PSDB. Pela manhã, lá esteve para se deixar fotografar e distribuir risos e abraços, o secretário Geraldo Alckmin – não ficou claro o papel dele como agente público neste programa. Depois, o secretário da educação, Paulo Renato, que não explicou o porquê da sua secretaria não ter feito absolutamente nada em termos de apoio a este programa. E, no final, não poderia de deixar de aparecer o governador-candidato José Serra que, junto com a pró-reitora, distribuiu a premiação aos dois melhores trabalhos de cada área. Prêmio: um laptop para cada equipe vencedora (detalhe: as equipes tinham até oito alunos bolsistas – como eles iriam dividir UM laptop não ficou claro!) e uma assinatura anual da revista da Fapesp para a escola do grupo vencedor (detalhe: esta revista está disponível na internet e é publicada por uma fundação vinculada ao próprio governo estadual). Só faltou dar como prêmio o sinal da TV Cultura por um ano...

A hipocrisia tucana não teve limites desta vez. Quase 16 anos de governos tucanos que praticamente arrasaram a educação pública estadual, salários dos professores achatados, total desprezo por este programa que foi praticamente bancado por empresas, sem qualquer preocupação em dar suporte a alunos e professores da rede para que ele reverberasse no ensino público e, no final, comparecem à festa!!! Um uso e abuso da boa vontade de professores e de alunos da escola pública que, com seu talento e capacidade, tentam furar o bloqueio imposto pelas péssimas condições do ensino público paulista.

*Dennis de Oliveira é professor da ECA-USP.

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