domingo, 15 de março de 2009

ELEIÇÕES EM EL SALVADOR: O PERIGO É A FRAUDE

Domingo, meio-dia: informações de El Salvador

Por Valter Pomar*

Desde as 4h30 da manhã estamos circulando de carro pela região metropolitana de San Salvador, composta por várias cidades, onde reside a maior parte da população do país.
Nos bairros mais pobres, é visível a preferência pela FMLN e por Maurício Funes.
Nos bairros de classe média, a preferência se inclina por Ávila, da Arena.
Ao que sabemos, a votação começou pontualmente, as 7h00, na maioria dos locais de votação.
As pessoas votam não por domicílio, mas por seu sobre-nome.
Todos os que moram num determinado município e têm o patronímico iniciado pela letra A, votam num mesmo lugar, mesmo que residam em locais distintos da cidade.
E, ao revés: dois vizinhos cujo sobrenome começa com letras distintas, vão votar em locais distintos.
O processo de votação é bastante confuso.
O eleitor deve apresentar seu documento de identidade.
Se confere este documento com uma lista. Detalhe: tanto no documento, quanto na lista, há fotos, mas estas fotos as vezes são diferentes.
Explico: as vezes o eleitor tem uma segunda via de seu documento, e a foto na relação eleitoral é da primeira via. Fotos distintas.
Uma vez que o eleitor é localizado na relação, ele recebe a cédula de votação, tamanho A4, talvez maior, onde há dois retângulos: um com Arena, outro com FMLN escritos.
Não se vota no nome dos presidentes, mas apenas no seu partido.
O voto é manual, assim como a apuração é manual e feita nos locais de votação.
Depois de assinalar seu voto, em cabine, o eleitor deposita a cédula na urna, coloca o polegar numa substâcia que lhe deixará "pintado" pelo resto do dia, assina a lista de votação e recolhe seu documento.
Nos 6 locais de votação que visitamos, vimos problemas de diversos tipos (mulher casada a quem não deixam votar, pois na lista de votação segue o seu nome de solteira; discrepância entre as fotos da cédula de identidade e da relação eleitoral; etc.).
Num bairro de classe média, numa cidade ao lado de San Salvador, cidade em que o prefeito é da Arena, acompanhamos o voto de Maurício Funes.
Apesar de ser um local de votação de predominância arenista, Funes foi recebido com um entusiasmo impressionante.
Detalhe: os arenistas presentes, embora em número expressivo, não fizeram provocação nem hostilidade, esboçando uma reação bem depois que Funes já havia ido embora.
A sensação é que o eleitorado de direita pressente que, desta vez, a FMLN vai ganhar.
Pesquisa de boca-de-urna feita por volta das 10h00, em 150 das 262 cidades do país, com 4.500 eleitores, deu 63% a favor de Maurício e 37% a favor de Arena.
Os sinais seguem os mesmo de ontem: tudo indica a vitória de Maurício Funes.
A militância da FMLN e os apoiadores de Maurício Funes, ademais de fortemente presentes nos locais de votação, estão muito ativos nas ruas.
Há bandeiras vermelhas em todos os locais, inclusive nos bairros de classe média.
Se a mobilização popular e a organização da campanha de Funes conseguirem manter o que vimos até as 12h00 deste domingo, derrotarão as tentativas de fraude.

Informações de sábado sobre El Salvador

A expectativa é de vitória de Maurício Funes, candidato da Frente Farabundo Marti.
As últimas pesquisas dão a ele 8,9 pontos de vantagem frente ao candidato da Arena: 42,3% contra 33,4%.
As mesmas pesquisas apontam uma simpatia de 48,4% em favor de Funes, contra 35,45 em favor do candidato da Arena.
Ao mesmo tempo, paira no ar a ameaça de fraude.
El Salvador tem cerca de 5 milhões e 800 mil habitantes.
Estão registrados para votar cerca de 4 milhões e 337 mil habitantes.
A quantidade de eleitores, num país com a demografia de El Salvador, só é possível se o "padrão eleitoral" incluir mortos, eleitores fantasmas, eleitores com mais de um registro etc.
Auditoria feita por um magistrado do Tribunal Eleitoral do país apontou a existência de 100 mil mortos, que continuam nas listas de votação.
A mesma auditoria encontrou 300 mil pessoas sem domicílio conhecido.
Foram localizados casos de eleitores com dois registros distintos.
E registros eleitorais em que a foto do eleitor no registro é distinta da foto que consta do documento.
Em El Salvador, os eleitores votam por "apellido".
Ou seja: voce vota no seu município, mas as urnas são organizadas pelo seu sobrenome.
Ou seja: dois vizinhos, se tiverem sobrenomes começando por "Z" e por "A", votam em locais distintos.
Isto prejudica os eleitores pobres, que têm dificuldades para se locomover até o local de votação.
Nas recentes eleições de janeiro, bem como nos últimos dias, constatou-se um fluxo de "eleitores" vindos de países vizinhos, para votar, com documentos falsos, na eleição de El Salvador.
Empresários reuniram seus trabalhadores e disseram que registrassem (com máquinas fotográficas embutidas em celulares) seu voto; quem votasse em Funes e na FMLN, seria demitido.
Por fim, há notícias de que partidários da Arena pretendem tumultuar os locais de votação, após o meio-dia, naqueles locais onde há forte votação em favor de Funes.
Arena controla 3 dos 5 magistrados do Tribunal eleitoral (que é composto por indicação dos partidos, portanto o 3x2 é institucionalizado).
A FMLN venceu por uma margem de 100 mil votos a eleição de janeiro de 2009.
Maurício Funes recebe apoio de setores que em janeiro não votaram na FMLN.
Logo, a fraude é o único mecanismo disponível para a direita.
A FMLN tem 200 mil militantes mobilizados em todo o país.
Milhares de observadores internacionais já estão no país.
O governo dos EUA declarou (diferente da eleição passada) que não apóia nenhuma candidatura e que tratará igualmente com quem vencer.
O atual presidente e seu candidato disseram que aceitarão o resultado eleitoral, se Funes vencer.
As urnas fecham as 17h (horário local).
As 18h30 é provável que já saibamos o resultado.
As 19h30 deve sair o primeiro boletim oficial.
O fundamental é saber se a mobilização popular e a organização da campanha de Funes conseguirão suplantar a fraude.

*´Secretário Nacional de Relações Internacionais do PT

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