Um grupo em São Paulo ajuda familiares a lidar com a homossexualidade de jovens e adolescentes
Mais de 80 jovens entre 13 e 24 anos ocupam- a sala na rua Major Sertório, no centro de São Paulo. Sentados em cadeiras, sofás ou em almofadas no chão, conversam, namoram, esclarecem dúvidas e falam sobre as dificuldades e os prazeres típicos desta fase da vida. No fim, participam de uma confraternização com lanche e música. O que os une nesta tarde de domingo não é política ou religião, mas a orientação sexual: eles são LGBTs (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais) ou querem conhecer pessoas que sejam, por conta de dúvidas quanto à própria sexualidade.
Uma adolescente loira e outro jovem fazem perguntas e comentários bem-humorados para os novatos. É uma maneira de descontrair o ambiente. A garota, que aqui será chamada de Cris, serve de exemplo de alguma das situações que levaram o Grupo de Pais de Homossexuais (GPH) a formar uma turma de jovens e adolescentes em situação semelhante. Edith Modesto, criadora do grupo em 1997 e sua presidente, observa os participantes.
Cris está com 16 anos e é uma transexual, ou seja, sabe que é uma garota por mais que seu corpo insista em tentar lhe convencer do contrário. Quem a vê, conhece o seu quarto ou a acompanha em sites de relacionamento percebe que a natureza é capaz de se enganar. E por conta desta diferença entre seu corpo e seus sentimentos está impedida de estudar. A família chegou a procurar cerca de uma dezena de escolas, entre elas algumas ditas "inclusivas", mas nenhuma quis matricular a garota. Cris conta que chegou a ter infecção urinária quando estava no ensino fundamental. Como a escola exigia que frequentasse o banheiro masculi-no, a adolescente evitava usá-lo.
A menina mora com a mãe e a avó, que, a pedido, não são identificadas neste texto. O irmão mais velho a evita. O pai tem uma relação dúbia com a garota; chegou a dar um aplique capilar para a filha, quando ela tinha os cabelos curtos, mas depois queria que tirasse. Apesar de se esforçarem para compreender a situação de Cris, a mãe e a avó também têm dificuldades. É comum escutar, principalmente por parte da avó, "meu neto" e "o" Cris. E até o resto da família costuma evitá-las.
A mãe de Cris ainda não sabia que a garota era transexual quando decidiu procurar o GPH. Preocupada com o filho de modos afeminados e que havia dito, aos 11 anos, não gostar de meninas, ela decidiu procurar Edith Modesto após assisti-la em um programa de tevê. Depois de conhecer o grupo, convenceu a filha a ingressar. "No começo não queria participar de um grupo com homossexuais, mas depois percebi que, apesar das diferenças, o convívio com eles era importante para mim", admite a adolescente.
Inicialmente, o GPH não tinha a intenção de virar uma entidade. A fundadora foi estimulada após descobrir que o caçula de seus sete filhos era homossexual. Professora aposentada da Universidade de São Paulo e autora de livros infanto-juvenis, sentiu necessidade de entender o que era a homossexualidade para poder aceitar a orientação de seu filho. Pela internet, formou uma rede de amigos gays em salas de discussão. Fazia perguntas e ao mesmo tempo passou a dar atenção aos desabafos dos jovens. Segundo ela, os relatos eram muitas vezes sobre as dificuldades de relacionamento com os pais, o preconceito em ambientes como a escola e a dificuldade em se aceitarem como são.
Yuri, um dos jovens que tinha Edith como amiga virtual, disse que a sua mãe não via problemas em sua homossexualidade. Desconfiada, a pesquisadora pediu o telefone de Clarice Cruz Pires. Dias depois, convidou outra amiga que tem um filho homossexual e Clarice para um almoço em sua casa. Da repetição desses bate-papos surgiu o GPH. Agora, cada encontro reúne de 10 a 30 participantes, na proporção de quatro mães para cada pai, no último domingo de cada mês, na casa de Edith.
O grupo cresceu depois de a pesquisadora começar a escrever livros sobre homossexualidade e a relação entre pais e filhos. Atualmente, mais de 200 mensagens com pedidos de ajuda ou orientação chegam a ela todos os dias. Já ouviu relatos de pessoas que tentaram o suicídio ao descobrirem a sexualidade dos filhos e de jovens que quiseram acabar com a própria vida por não serem aceitos. Conversou com pais que agrediram os filhos quando souberam ou que quiseram matar o namorado do filho ou a namorada da filha. Reconstruir estes relacionamentos familiares é um ponto central do trabalho.
Neusa Dutra já sabia que o filho Francisco era homossexual quando leu um texto de Edith Modesto em uma revista. "Fiquei chocada de ver uma mãe falar sobre isso com naturalidade. Eu sabia do Chico, havia contado para algumas pessoas mais próximas, mas sempre com um ar de lamento", relembra. Sua postura mudou após iniciar a participação no GPH. Neusa, assim como Clarice, continua no grupo para ajudar outras mães.
Passados dez anos da fundação do grupo, Edith percebeu a necessidade de voltar a falar com os jovens. Eles se reúnem no primeiro domingo de cada mês, na rua Major Sertório, para conversar e no terceiro, na rua Frei Caneca, para ver filmes.
Há jovens que ainda não contaram para seus pais sobre sua sexualidade e procuram liberdade, carinho e aceitação dentro do grupo. "Estou lá como a mãe compreensiva", explica a presidente da entidade. Mas há também quem procure uma entidade de defesa dos direitos de jovens LGBTs. É o caso da transexual Paty, de 16 anos. Cansada das humilhações, havia abandonado a escola. Cabelos longos e bem tratados, maquiada, com as unhas pintadas e um corpo cada vez mais feminino por conta dos hormônios que toma há um ano e meio, ela era alvo de zombaria na sala de aula quando era chamada pelo seu nome de registro, masculino. A presidente do GPH demorou mais de seis meses para convencer a direção da escola a colocar o nome social de Paty na lista de chamada. Conseguiu e agora a garota está de volta às aulas. •
Fonte: Revista Carta Capital
quarta-feira, 31 de março de 2010
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2 comentários:
Preciso me aliar a um grupo de apoio a familiares de homossexuais. Por favcor me informe datas e horários, pois gostaria de frequentar com inha filha.
ESTELA
Existe algum contato para esse local de encontre de jovens homossexuais?
por favor, se possivel, me envie.
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