sexta-feira, 3 de setembro de 2010

LEI PUNE QUEM FALAR MAL D0 (A) EX

Lei que pune pai por falar mal de ex é um marco, diz ong

Ney Rubens/06.08.08/Especial para Terra
Em Minas, pai protesta por não poder visitar a filha
Em Minas, pai protesta por não poder visitar a filha

Ana Cláudia Barros

O termo ainda é pouco conhecido, mas a prática é recorrente e vitima, com frequência, crianças e adolescentes, provocando danos psicológicos. A síndrome da alienação parental (SAP), situação em que o pai ou a mãe difama o outro conjuge na tentativa de afastar o filho dele, tornou-se passível de punição com sanção da Lei 12.318, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na semana passada.

Terra Magazine convidou o presidente nacional da Associação de Pais e Mães Separados (Apase), Analdino Rodrigues Paulino, para falar sobre o que muda após a vigência da lei, que não só aplica penalidades ao infrator, como também define, com clareza, o que pode ser considerado alienação parental, cuja maioria dos casos está associada a processos de separação conjugal.

Na opinião de Paulino, a norma é um marco na história do Direito de Família e está afinada com as mudanças ocorridas nos últimos anos na sociedade.

- Ela vem contribuir para que a família amadureça mais. Na hora da separação, é preciso compreender que o papel do homem não é mais apenas de provedor. Ele também é educador, ajuda a criar o filho. A lei da alienação parental vem garantir essa conquista do homem. E completa: "Traz estabilidade porque o genitor que descumpri-la, realmente, vai ser punido."

O presidente da organização não governamental destaca que a elaboração da nova legislação contou com a contribuição de milhares de pais que vivenciaram o problema. Paulino foi um deles.

- Foram seis anos e meio de briga judicial e 22 processos. Uma luta imensa. Minha filha, que hoje tem 12 anos, sofreu terrivelmente. Eu sofri e a mãe da criança também. É um jogo em que todos saem perdendo. Não há ganhador.

Confira a entrevista.

Terra Magazine - A Apase é autora do anteprojeto que originou a lei. O que representa para vocês a aprovação dessa legislação e quais as mudanças que ela vai implementar?
Analdino Rodrigues Paulino -
O principal que consideramos é o seguinte: com a modernização, houve uma mudança das mulheres, de casa para o mercado de trabalho. Hoje o mercado de trabalho é disputado palmo a palmo entre mulheres e homens. Da mesma forma que a mulher veio para o mercado de trabalho, houve o retorno do homem para o lar.
O que isso quer dizer? Que a participação masculina na criação do filho passou a ser significativa, ocupando uma posição mais ou menos igual a da mãe.

Então, não haveria, na sua opinião, mais sentido a Justiça conceder, na maioria dos casos, a guarda dos filhos às mulheres?
Exatamente. Na hora de uma separação, a Justiça e mesmo a mulher pensam: "O homem paga a conta e a mulher cuida. O homem é o provedor e a mulher é a rainha do lar". De 20 anos pra cá, cada vez menos isso tem acontecido. A família se modernizou, a sociedade se modernizou, mas a Justiça da Família não. Muito mais do que a lei do divórcio ou do que qualquer outra lei que tenha havido em relação à família, essa lei da alienação parental vem contribuir para que a família amadureça mais. Na hora da separação, é preciso compreender que o papel do homem não é mais apenas de provedor. Ele também é educador, ajuda a criar o filho. A lei da alienação parental vem garantir essa conquista do homem.

Como isso ocorreria?
Na hora da separação, o juiz concede a guarda à mulher e, ao homem, o dever de pagar a conta. Determina a ele visitas quinzenais. Na hora que o homem separa, ele deixa de participar da criação do filho e vira um mero visitante, um pai de McDonald's. Ele passeia, leva à praça, à lanchonete. O tempo dele se esgota e ele tem que devolver o filho à mãe. A convivência paterna foi muito destruída com as separações. Essa lei veio restabelecer a importância, garantir a participação do homem na criação do filho.

A lei pune quem praticar a alienação parental.
A lei da alienação parental caiu no gosto do Judiciário. Tenho uma explicação para isso. Trabalhamos essa lei como se fosse uma receita de bolo, em que há os ingredientes e o modo de fazer. Os ingredientes são as definições da alienação parental. O que é? O pai falar mal da mãe e vice-versa, o pai afastar a criança da mãe ou a mãe afastar a criança do pai, é o pai não querer visitar a criança, é a mãe dificultar a visita paterna. Então, está tudo definido.

Há, ainda, a manipulação emocional da criança.
Na hora em que você está falando mal... Por exemplo: a criança ganha um presente da mãe e o pai fala: "Mas logo isso que ela foi te dar? Uma bobagem". Ou o pai dá um brinquedo e a mãe comenta: "Seu pai continua com mau gosto". Essas são manifestações de alienação parental que a própria lei já caracteriza.

Mas e a questão das punições previstas na lei?
Aí, vem o modo de fazer o bolo, que é a gradação que a lei estabelece para o genitor que aliena. A primeira punição é a advertência. Veja que ela parte de algo brando. O juiz chama o casal para uma audiência e faz a advertência para a pessoa que está cometendo alienação parental. Se o alienador repetir a prática, o juiz aplica multa. Normalmente, é uma multa pesada para ela não ter valor somente simbólico.

Qual a penalidade máxima prevista na lei?
É exatamente a inversão da guarda. O juiz, hoje, vai ficar muito mais tranquilo ao inverter a guarda de uma criança, por exemplo, do que ficaria com a Lei da Guarda Compartilhada, em que os dois pais têm domínio igual e obrigações iguais. A lei da alienação dá todo esse embasamento que te falei. Na hora em que o juiz vai dar a penalidade máxima, ele já passou por todos os caminhos. Então, ele dá a penalidade máxima sem se preocupar.

Vocês aventaram a possibilidade de ocorrer uma certa dificuldade para se provar a alienação parental?
Não precisa de laudo psicológico. O laudo é só quando a coisa está complexa e você quer saber a dimensão, o quanto a criança foi atingida.

Mas as denúncias são baseadas no que exatamente? No depoimento da criança?
Nas informações processuais. Por exemplo, a mãe não permite que o pai veja a criança.

E nos casos de falsa denúncia?
O juiz checaria a veracidade. Colocaria o conselho tutelar, a equipe psicossocial para investigar. Mas, normalmente, na frente do juiz, a pessoa não engana.

Dois artigos da lei foram vetados pelo presidente Lula: o que previa que os envolvidos travassem acordo extrajudicial e o que previa prisão de seis meses a dois anos para o pai ou a mãe que apresentassem relato falso?
A Apase, na verdade, é contra o veto apenas do acordo extrajudicial. As pessoas são adultas, podem decidir sua própria vida. O outro artigo foi retirado pelo seguinte: o legislador final, o Ministério da Justiça, considerou que - e a Apase concorda - a prisão do genitor castigaria também a criança.

O senhor citou alguns exemplos de alienação parental. Quais os casos mais recorrentes?
É isso: o pai falar mal do pai ou o pai falar mal da mãe. A criança tem dois esteios: o pai e a mãe. Se um fica afastando a criança do outro, ela perde um dos esteios.

Quais as principais consequências para a criança?
A primeira consequência é a introspecção. A criança perde a espontaneidade. Depois, começa a perder e a ter dificuldades de fazer amigos, vai mal na escola. A criança vai perdendo toda estrutura. As meninas se envolvem com sexo bem mais cedo. Os meninos acabam se envolvendo com drogas.

Vocês, da associação, têm estatísticas sobre alienação parental?
Segundo pesquisa do Datafolha, feita no final do ano passado, o Brasil tem 60 milhões de crianças, adolescentes e jovens na faixa de 0 a 17 anos. Desses 60 milhões, cerca de 20 milhões são filhos de pais separados, ou seja, estão sujeitos à alienação parental. Uma parte significativa desses 20 milhões sofre com o problema. É mais comum do que se pensa e grave. A lei traz estabilidade porque o genitor que descumpri-la, realmente, vai ser punido. Não foi uma lei feita por uma ou duas pessoas. Ela foi feita dentro do nosso fórum com todos os pais e profissionais ligados à Apase, dando opinião. Temos contato com mais de 10 mil pais.

Você é presidente da Apase. Presumo que tenha vivido o problema.
Não tenha dúvida. Foram seis anos e meio de briga judicial e 22 processos. Uma luta imensa. Minha filha, que hoje tem 12 anos, sofreu terrivelmente. Eu sofri e a mãe da criança também. É um jogo em que todos saem perdendo. Não há ganhador.

Como foi o desfecho do seu caso?
Conquistei novamente a mãe da minha filha. Não como mulher, mas como amiga.

Na sua avaliação, ainda há um despreparo por parte da Justiça para lidar com esse tipo de situação?
Temos um despreparo maior não é por parte do juiz, mas da equipe técnica do Judiciário, que são psicólogos e assistentes sociais, que não sabem medir a gradação da alienação parental. O juiz não tem obrigação das nuances da alienação parental.

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