Monstruosa Armação
Editorial do informativo Brasília Confidencial 10/09/2010
O texto da Folha mencionado a seguir esta cortacolado ao final.
O filme “A Vila” não é lá grande coisa, mas seu cenário é cheio de metáforas: um lugarejo de onde ninguém ousa sair por medo de monstros que habitariam a floresta que o cerca. Alguém disse que os monstros existem, mas eles nunca foram vistos e ninguém tem coragem de procurar a verdade.
Há exatos três meses, em 12 de junho, o maior jornal do país publicou uma notícia que, embora não citasse nenhuma fonte, era taxativa: um “grupo de inteligência” do comitê eleitoral de Dilma Rousseff usara dados fiscais sigilosos do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge, na montagem de um dossiê contra José Serra. Descobriu-se depois que outros sigilos teriam sido quebrados – da filha de Serra, do genro dele, de mais dois tucanos de alta plumagem – e ficou estabelecido a partir daí, como fato incontestável, que todos os dados acabaram fazendo parte do mesmo dossiê.
Assim como as feras da floresta de “A Vila”, os monstros que habitariam o submundo da campanha de Dilma nunca foram vistos em ação. Não há provas de que algum crime tenha sido cometido. Não há sequer indícios de que alguma ação clandestina tenha sido praticada. E praticamente ninguém teve coragem de procurar a verdade.
Até que…
A própria Folha de S. Paulo, autora da denúncia, publicou ontem, sexta-feira, uma notícia que desmente, uma por uma, suas acusações.
Depois de 90 dias em que tratou todas as contestações de Dilma e do PT com arrogância, a Folha confessa, em texto sem assinatura, produzido pela sucursal de Brasília: o comitê de Dilma não produziu um dossiê; apenas teve acesso a um dossiê feito pelo PT de São Paulo há cinco anos. Trata-se, na verdade, de uma papelada de cem páginas escrita pelo partido para solicitar que o Ministério Público e a Procuradoria da República investigassem possíveis irregularidades em privatizações tucanas, que poderiam ter beneficiado José Serra, sua filha e seu genro.
A Folha informa que o material que teria sido produzido pelo suposto “grupo de inteligência” da campanha de Dilma “é idêntico ao que o partido havia encaminhado cinco anos antes ao MP”. O jornal ainda confessa que as cem páginas produzidas pelo PT paulista resultam “de pesquisa em cartórios de registros de documentos, na Junta Comercial de São Paulo e em sites na internet”. E mais: reconhece que “não há nesse lote de papéis indício de quebra de sigilo bancário ou fiscal”.
Não há monstros na floresta. Apenas mentira e medo para assustar os moradores da vila.
A Folha não se retrata. Limita-se a noticiar “naturalmente” que mentiu. Durante 90 dias todos os grandes jornais e revistas adotaram as acusações da Folha como postulado e ponto de partida para a cobertura dos vazamentos de dados da Receita. Nos últimos 20 dias, praticamente não se falou em outra coisa, inclusive no Jornal Nacional, que tem dedicado blocos inteiros ao assunto.
Alguém vai pagar por isso?
No momento, quem paga é o eleitor, privado de informações isentas da imprensa. No dia 3 de outubro, a conta pode ser jogada na mesa da oposição. E a vila toda poderá, enfim, passear livremente na floresta. Sem medo.
São Paulo, sexta-feira, 10 de setembro de 2010
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http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/po1009201014.htm
DE BRASÍLIA
O comitê da pré-campanha da candidata à Presidência Dilma Rousseff teve em mãos um dossiê sobre a filha do adversário José Serra (PSDB) com documentos reunidos pelo PT paulista.
Tal papelada havia sido utilizada pelo partido em 2005 para solicitar ao Ministério Público a abertura de inquérito sobre uma empresa de Veronica Serra e do marido, Alexandre Bourgeois.
O nome de Veronica voltou ao noticiário da campanha presidencial na semana passada. A Receita admitiu que a filha do candidato tucano teve as declarações de bens e de renda violadas, a partir de procuração falsa.
Serra tem responsabilizado Dilma pela quebra de sigilo, o que a petista nega.
A Folha teve acesso a cerca de cem páginas do dossiê do PT paulista sobre Veronica. É o resultado de pesquisa em cartórios de registros de documentos, na Junta Comercial de São Paulo e em sites na internet.
Não há nesse lote de papéis indício de quebra de sigilo bancário ou fiscal.
A papelada circulou no “grupo de inteligência” que no início do ano trabalhava para o comitê de Dilma -equipe que foi desmantelada quando a imprensa noticiou sua existência e as tratativas de contratar “arapongas” para espionar oponentes e até mesmo aliados.
ORIGEM PAULISTA
O material é idêntico ao que o partido havia encaminhado cinco anos antes ao Ministério Público estadual e à Procuradoria da República de São Paulo.
O pedido de abertura de inquérito foi uma iniciativa do então líder da bancada petista na Assembleia Legislativa, Cândido Vaccarezza. Hoje ele é deputado federal, líder do governo na Câmara e apontado como um dos favoritos a ocupar a presidência da Casa a partir de 2011.
Em junho de 2005, Vaccarezza chegou a propor uma CPI na Assembleia para investigar uma suspeita levantada pelo PT de que a empresa de Veronica e do marido havia sido favorecida em leilões na CPTM (companhia de trens), no Metrô e na Sabesp (empresa de saneamento).
As apurações do PT a respeito de Veronica começaram logo após o primeiro turno da eleição para a Prefeitura de São Paulo, em 2004. Serra era o candidato do PSDB e viria a ganhar a disputa contra a então prefeita Marta Suplicy (PT).
Em 2005, a Procuradoria da República paulista abriu procedimento administrativo (investigação prévia presidida por um procurador) para averiguar “crimes contra a ordem tributária e fraude em licitação” desses leilões.
O procedimento deu origem a uma ação judicial, que passou a tramitar na 8ª Vara Federal Criminal paulista.
Contudo, em 2006, o próprio procurador responsável pelo caso pediu o arquivamento da ação. Veronica e seu marido não chegaram a ser chamados nem acusados de nenhuma irregularidade.
O caso foi arquivado na Justiça Federal e no Ministério Público em 2008.
OUTRO LADO
A liderança do PT na Assembleia disse à Folha que agiu dentro da lei e com o propósito de fiscalizar o uso de dinheiro público, tarefa do Legislativo.
Em notas à imprensa e declarações de seu presidente, José Eduardo Dutra, o PT tem afirmado que o partido e a coordenação da campanha de Dilma “não autorizaram, orientaram, encomendaram, solicitaram ou tomaram conhecimento” de dossiês.
Procurada para comentar as investigações realizadas pelo PT-SP acerca da empresa de Veronica, a assessoria da campanha de Serra soltou uma nota: “As especulações da reportagem dão curso às tentativas do PT de jogar lama na campanha na família do candidato José Serra”.
“Trata-se da prática de construir dossiês fajutos com informações falsas e insinuações criminosas. Não cabe nenhum comentário a não ser veemente repúdio a quem fez e a quem está divulgando baixarias”, diz o texto.
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Frases:
(Folha – http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/po1009201026.htm)
Há diferenças que vão desde o contexto histórico de formação dos partidos e constituição dos regimes até a maneira como se relacionam com o Estado
CARLOS ALBERTO SAMPAIO BARBOSA
professor da UnespÉ perfeitamente possível que um partido vença seguidas vezes sem que isso signifique riscos para a democracia
CLÁUDIO GONÇALVES COUTO
professor da FGV
Antes da “mexicanização”, que requer 70 anos no poder, deveriam falar em “suecização”, pois na Suécia a social-democracia ficou 44 anos no poder, e japanização, pois os liberais-democratas governaram o Japão por 54 anos
ALBERTO CARLOS ALMEIDA
cientista político
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