terça-feira, 2 de dezembro de 2008

CABRAL, HÉLIO LUZ E A OCUPAÇÃO DO MORRO DONA MARTA

Nesse final de ano, o editor deste blog teve acesso a duas abordagens sobre o combate ao tráfico de drogas na cidade do Rio de Janeiro. Uma, a partir de manchete bombástica na primeira página do jornal O Dia (2/12.08): “CABRAL AFIRMA: TRÁFICO NO DONA MARTA ACABOU” - assim mesmo foi publicada, em caixa alta -, e outra através do artigo “A Favela é a Senzala do século XX!” do delegado Hélio Luz (foto do livro "Hélio Luz, um xerife de esquerda" escrito pelo jornalista Cid Benjamim), ex-chefe da Polícia Civil do governo Marcello Alencar, e ex-deputado estadual do PT, publicado inicialmente no jornal Nova Democracia, e depois na seção de artigos da página nacional do PT (http://www.pt.org.br/)

O governador do Rio, segundo a matéria com chamada de primeira página e desenvolvida na abertura e em pequenas notas na coluna Informe do Dia (página 4), assinada pelo jornalista Fernando Molica, assegura que com a ocupação por parte da Polícia Militar, o comércio de drogas desapareceu. “Os bandidos foram embora”, garantiu Sérgio Cabral, acrescentando que a presença da PM no Dona Marta provocou redução dos índices de roubos e furtos na Rua São Clemente (bairro de Botafogo), principal acesso do morro - destaca a chamada da matéria do jornal. A ocupação será permanente e deve se estender aos morros da Babilônia e Chapéu Mangueira, no Leme, segundo teria declarado ao jornal o governador do Estado do Rio.

Já o artigo de Hélio Luz demole a tese amplamente disseminada da existência do crime organizado no Rio, a partir do comércio de drogas, chefiado pelos bandos que o controlam nas comunidades faveladas: ”Como podem os desapropriados, explorados e oprimidos se organizarem numa máfia”, indaga o texto. “A favela é um gueto que substitui o local da senzala. É a senzala do século XXI, onde se situam a reserva de mão de obra, os negligenciados pelo Estado – reserva mantida pelo sistema de exploração. É aí que vamos tocar na origem da policia, criada para fazer o controle dessa população. Em 1808, era o controle dos escravos, agora é o controle dos favelados – os negligenciados” afirma.

Hélio Luz faz questão de destacar que em função de tais características, o tráfico nas comunidades está longe de se constituir crime organizado e poder paralelo no Estado, “Estado paralelo é aquele que dá enfrentamento ao Estado e modifica as suas decisões. Aquele bando que existe lá no morro do Alemão, não tinha condições de fazer isso” e sugere que a poderosa Fetranspor (Federação das Empresas de Transportes de Passageiros) é o melhor exemplo de tal postura frente ao Estado. “Ela, sim, enfrenta e impõe suas decisões ao governo. Ela coloca oito mil ônibus nesta cidade, que não tem capacidade para isso. Todos os poderes de Estado se submetem a sua vontade” explica.

Cita o jogo do bicho para definir o que, segundo ele, é crime organizado: primeiro ser cartelizado, segundo, a sua existência em nível nacional e, terceiro, estar infiltrado nos poderes constituídos. “Ele elege a representação política dele dentro da Assembléia Legislativa, da Câmara dos Deputados e da Câmara dos Vereadores. Banca campanhas voltadas para o poder executivo. No geral ele tem influência em todos os poderes, inclusive no judiciário” garante o delegado, que cita também a presença do jogo do bicho no carnaval do Rio, através da Liesa (Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro), dirigida pelos banqueiros de bicho com a anuência do poder público. Na opinião deste blog, uma relação imoral que o prefeito eleito, Eduardo Paes, cuja a gestão o PT decidiu participar, até o momento não fez menção de por fim.

O artigo de Hélio Luz é uma peça que permite avaliar o grau de irresponsabilidade contido em declarações como a de Cabral, que nos remete a outra semelhante dada 1986, pelo ex-governador do Rio, Moreira Franco, que iria acabar com a violência em seis meses. Além de retórica vazia, tal concepção de combate á criminalidade contida em tais declarações, expõe uma visão elitista e preconceituosa em relação às camadas mais pobres da cidade, atribuindo a elas a paternidade da violência presente na cidade do Rio de Janeiro. Para combatê-la, portanto, a pirotecnia das ocupações de favelas com a PM, que rendem boas matérias jornalísticas, mas não explicam como e não evitam que as drogas cheguem naquelas comunidades, em detrimento do verdadeiro enfrentamento que deve ser feito, como assinala Luz.

“O que acontece no Rio de Janeiro? O chamado crime organizado é mantido pela organização que existe dentro do próprio Estado. É a própria polícia que mantém isso. Uma boa parte da polícia do Rio de Janeiro é corrupta! Essa afirmação não constitui novidade. Basta procurar nos jornais nos últimos três meses. É essa polícia corrupta que mantêm o narcotráfico no Rio de Janeiro. Não só a polícia civil e militar do Rio de Janeiro mantêm os pontos do narcotráfico do Estado, mas também a Polícia Rodoviária Federal e a Polícia Federal. O aparelho de repressão do Estado do Rio de Janeiro é corrupto de tal forma, que concorre com ele mesmo.”- define Hélio Luz.

Se for fato o que sustenta em seu artigo o ex-chefe da Polícia Civil, tal ocupação esta mais perto de se constituir num grande problema, do que numa engenhosa solução. O tempo dirá.

Nenhum comentário: